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Veja os 12 golpes mais usados na pandemia e como evitá-los: clonagem de WhatsApp, maquininhas, perfil fake são algumas modalidades

Bandidos aproveitam uso das plataformas digitais, contato prioritariamente pelo telefone com centrais bancárias, mas ainda há quem caia nas antigas armadilhas

Aumenta o número de golpes Foto: André Mello - Editoria de Arte

O distanciamento social causado pela Covid-19 desde março do ano passado intensificou os contatos virtuais e acabou tendo um “efeito colateral” fora da esfera da saúde pública. Em 2020 e 2021, os casos de estelionato explodiram no Rio. Os golpistas aproveitam o uso das plataformas digitais, contato prioritariamente pelo telefone com centrais bancárias e o uso cada vez mais frequente de aplicativos de entrega para fazer vítimas. Mas nem só dos esquemas tecnológicos vivem os estelionatários: ainda há quem caia em velhas armadilhas, como o antiquíssimo golpe do bilhete premiado.

Em 2019, foram registrados no estado do Rio 22.633 casos de estelionato de janeiro a julho. Em 2020, o número passou para 28.017 no mesmo período; e, em 2021, saltou para 34.995 registros do crime, segundo números do Instituto de Segurança Pública. O aumento de 2019 para 2021 foi de 56%.

— Com as pessoas ficando mais em casa, estão mais suscetíveis ao uso de meios virtuais. Vão menos às agências bancárias, a empresas. Então eles (criminosos) conseguem mascarar melhor suas reais intenções — analisa o delegado Bruno Gilaberte, titular da 5ª DP (Mem de Sá) e responsável por investigar e prender uma quadrilha de estelionatários que tinha como principais alvos servidores públicos.

E além da comunicação virtual ou remota, os criminosos também se valem do contato pessoal com as vítimas, como taxistas que aplicam golpes em passageiros ou ainda da crise financeira para fisgar quem busca aumentar sua renda com supostos investimentos que parecem tentadores. Basta verem uma brecha para os bandidos agirem.

O GLOBO listou golpes aplicados pelos criminosos no Rio e traz histórias de pessoas que foram vítimas dessas quadrilhas, como o servidor público W., de 59 anos, que teve um prejuízo estimado em R$ 200 mil ao ser enganado pelos golpistas presos pelo delegado Bruno Gilaberte. O homem adquiriu empréstimo consignado e repassou o dinheiro a uma empresa que prometia investir a quantia, trazer lucros à vítima e ainda pagar o valor devido ao banco.

—  Quando a esmola é muita, o santo tem que desconfiar — ensina o servidor.

Clonagem de WhatsApp

Golpistas se passam por pessoa conhecida e pedem depósitos

O golpe da clonagemdo WhatsApp Foto: André Mello - Editoria de Arte

O advogado e jornalista N.estava em um dia de trabalho intenso, no fim do mês passado, quando recebeu uma mensagem pelo WhatsApp de um número desconhecido. Do outro lado, a pessoa se identificava como seu filho mais velho e alegava ter mudado de número. Na foto de perfil do aplicativo, tinha uma imagem do rapaz. No total, durante dois dias, o golpista pediu à vítima depósitos de mais de R$ 12 mil, alegando precisar do dinheiro para alguns gastos que teria, como conserto de um telefone celular.

Acreditando estar realmente falando com o filho, ele fez as transferências. Na semana anterior, a vítima tinha ficado sabendo de algumas mudanças na rotina do rapaz, que não mora com ele, como entrada em um novo emprego e uma expectativa de se mudar. As novidades das quais teve notícia fizeram o advogado acreditar que o filho realmente necessitava do suporte financeiro.

O primeiro contato do golpista foi numa quarta-feira. Na sexta, com o quarto pedido de depósito, N. foi mais insistente em alguns questionamentos dos quais o golpista ficara se esquivando. Sem conseguir contato por ligação naquele número, decidiu ligar para o telefone do filho mais novo. A chamada caiu e o primogênito fez contato pelo seu próprio celular, ainda em funcionamento. Ao perceber que o filho ligava do antigo telefone, a vítima já notou algo estranho.

— Quando atendi, já comecei a questionar sobre o porquê de ele estar pedindo tanto dinheiro, querendo saber o motivo. Jamais vou esquecer a resposta dele, na maior calma. Ele falou: Que dinheiro, pai? Nesse momento, caiu a ficha, fiquei gelado e o mundo parou de girar. Fiquei em silêncio um minuto e meio. Depois, durante outros cinco minutos, chorei sem parar.

O que aconteceu com o advogado e jornalista ficou popularmente conhecido como “golpe no WhatsApp”. Nele, uma pessoa tem o aplicativo de mensagens ou lista de telefone clonados. Para isso, em geral, os golpistas conseguem acesso a um código que é enviado para o celular da vítima por mensagem de texto, possibilitando a clonagem do WhatsApp ou da lista. Os criminosos fazem contato alegando ser de alguma empresa e solicitam o código recebido.

Se a vítima não tiver habilitado a autenticação em duas etapas do WhatsApp, a clonagem é possível. Em alguns casos, os golpistas conseguem acesso à própria conta da pessoa, com o número usado por ela. Em outras, tem acesso à lista de telefones. Nos dois casos, o passo seguinte é fazer contato com parentes e amigos para pedir depósito de quantias de dinheiro.

Quando conseguem apenas clonar a lista de telefones, os golpistas se passam pela pessoa da qual roubaram os contatos, alegando ter trocado de número de celular. Para dar mais veracidade, eles colocam foto da própria pessoa no perfil do WhatsApp.

O advogado e jornalista vítima do “golpe do WhatsApp” acredita que plataformas digitais e bancos deveriam agir de forma mais eficaz para contribuir para redução desse tipo de fraude.

— A precaução individual é importante e não resolverá a pandemia de golpes virtuais. As plataformas digitais e os bancos precisam assumir responsabilidades. Não basta alertar. Precisam investir em tecnologia para detectar movimentações atípicas e agir numa frente institucional conjunta. O que fazem hoje é pouco, até para os seus acionistas — critica.

Perfis fake nas redes

Criminosos forjam páginas de hotéis e lojas e oferecem vantagens

Perfis falsos nas redes sociais Foto: André Mello - Editoria de Arte
Perfis falsos nas redes sociais Foto: André Mello – Editoria de Arte

Em seu perfil no Instagram, o publicitário X. recebeu uma oferta tentadora: bastava passar seu nome e telefone para participar do sorteio de três diárias do hotel fazenda Gamela, em Cantagalo, no interior do Rio. Após enviar os dados, a vítima recebeu uma mensagem com um código, que forneceu aos golpistas após nova solicitação. O homem não percebeu, mas tinha acabado de passar aos criminosos os números necessários para que eles clonassem seu WhatsApp.

Acessando o aplicativo de mensagens, os bandidos solicitaram depósitos dos contatos do publicitário. A irmã do dono da  conta fez dois PIX para os golpistas, de R$ 350 e R$ 200.

— Acreditei que aquele instagram era mesmo do hotel e fiquei interessado na promoção, que era muito boa. Não me dei conta de que estava sendo vítima de um golpe. A gente sente até vergonha de ter sido passado para trás assim  — afirma X, que prefere não se identificar.

Nesse tipo de fraude, os golpistas usam praticamente o mesmo nome de usuário do perfil verdadeiro, acrescentando em geral apenas uma letra, e usam foto igual à da página oficinal. Para fisgar as vítimas, criam falsas promoções. O hotel fazenda Gamela já fez três postagens, desde o início deste ano, alertando os hóspedes sobre os perfis falsos com o nome do estabelecimento. “Muita atenção. O hotel fazenda Gamela possui apenas esse perfil, com mais de 68 mil seguidores no Instagram”, escreveu o estabelecimento. Nesse tipo de golpe, há ainda registros de pessoas que acabam fechando reservas de hospedagem com os perfis fake.

Além de hotéis, o mesmo vem sendo feito com redes sociais de lojas. Muitas vezes, os criminosos fazem contato com pessoas que fazem reclamações em comentários de postagens desses locais, queixando-se de prazos de entrega, por exemplo. Pelo perfil falso, os golpistas também solicitam dados da vítima com o objetivo de conseguir o código do WhatsApp.

Bilhete premiado

Criminosos levam vítimas a acreditarem que ganharão fortuna em loteria

O golpe do bilhete premiado Foto: André Mello - Editoria de Arte
O golpe do bilhete premiado Foto: André Mello – Editoria de Arte

B., de 79 anos, caminhava por uma rua da Tijuca, em julho deste ano, quando foi abordada por uma mulher que dizia possuir um bilhete premiado no valor de R$ 800 mil e alegava dificuldades para sacar o dinheiro. Com a ajuda de uma comparsa, a golpista conseguiu convencer a idosa a sacar e lhe entregar R$ 10 mil, afirmando que, caso ela a ajudasse a retirar a quantia, receberia parte do prêmio.

Tudo não passava de um golpe. Em um universo de novas artimanhas usadas pelos criminosos para enganar as vítimas, algumas antigas ainda são usadas. O golpe do qual B. foi vítima é popularmente conhecido como bilhete premiado.

Nele, um criminoso costuma abordar a vítima, contando uma história em relação a um suposto bilhete premiado e, alegando dificuldades para fazer a retirada de uma quantia milionária à qual teria direito. Nesse golpe, enquanto a pessoa que vira alvo da quadrilha é abordada pelo primeiro integrante, uma terceira pessoa se aproxima, fingindo desconhecer o comparsa que já conversa com a vítima. Essa pessoa se oferece para ajudar, dando veracidade à situação.

A aposentada B. foi levada pelos golpistas a duas agências bancárias para fazer a retirada de de R$ 5 mil em cada uma delas. Após a entrega da quantia, as criminosas fugiram. No “golpe do bilhete premiado”, os idosos são os principais alvos dos criminosos.

— Fiquei com pena da primeira moça que me parou na rua e quis ajudar. E quando a segunda mulher parou para conversar conosco, também oferecendo ajuda, acreditei não ser golpe — afirma a aposentada.

O caso foi registrado na 19ª DP (Tijuca), que tenta identificar as duas mulheres que abordaram a idosa.

Reservas com dados falsos

Alvos são proprietários de imóveis que anunciam em páginas como Airbnb

O golpe da reserva com dados falsos Foto: AndréMello - Editoria de Arte
O golpe da reserva com dados falsos Foto: AndréMello – Editoria de Arte

Os dados furtados pelos estelionatários de vítimas de golpes bancários são usados em novas fraudes. Os criminosos fazem reservas de casas ou apartamentos em sites de imóveis e agendam passeios de barco ou até mesmo voos de helicóptero, sempre utilizando os dados de cartões de crédito obtidos em crimes anteriores.

Um grupo de estelionatários preso em janeiro pela 12ª DP (Copacabana) em um imóvel de luxo em São Conrado, na Zona Oeste do Rio, é investigado por suspeita de aplicar esse golpe. Pela reserva da casa onde eles estavam hospedados, foi pago R$ 12,7 mil de diárias. A suspeita é de que o pagamento tenha sido feito de forma fraudulenta, utilizando dados bancários de terceiros.

Nesse tipo de fraude, os estelionatários adquirem em grupos no WhatsApp, com outros golpistas, dados de cartões de crédito de vítimas de outros golpes. Com as informações, fazem várias compras e reservas. Muitas vezes, utilizam ainda documentos de identidade falsos.

Nas redes sociais, integrantes do grupo preso em São Conrado postavam fotos em passeios de lancha e de helicóptero. Eles são suspeitos de terem feito as reservas também com os dados falsos.

Entregadores de aplicativos

Vítimas desses golpes são usuários de serviçso de delivery de comida

Golpes cometidos por entregadores de aplicativos Foto: André Mello - Editoria de Arte
Golpes cometidos por entregadores de aplicativos Foto: André Mello – Editoria de Arte

Um dos golpes mais recentes é o aplicado por entregadores de comida por aplicativos pelo celular. Com o aumento dos pedidos on-line em razão da pandemia, os golpistas encontraram uma brecha para uma nova modalidade criminosa.

Os clientes dos aplicativos relatam dois diferentes tipos de golpes. Em ambos os casos, os entregadores digitam nas máquinas de cartão de crédito e débito valores superiores àqueles que afirmam estar cobrando. As vítimas não notam a fraude e colocam as suas senhas, autorizando a compra.

Em um dos golpes, o entregador afirma que houve problemas com a taxa de entrega, por isso será necessário efetuar o pagamento diretamente a ele. Em outro, comunicam supostos problemas com a entrega em si, também para que o valor total do pedido seja pago a ele.

O aposentado Y., de 67 anos, teve um prejuízo de R$ 5 mil ao cair no golpe. Além de ter passado no cartão de débito valor bem acima do que supostamente deveria ter sido cobrado pelo lanche pedido, o homem que afirmou ser entregador de aplicativo ainda furtou seus dados bancários.

Y. registrou o caso pela internet. Ele relatou ter feito o pedido em um restaurante da região onde mora que custaria R$ 45. Algum tempo após o pedido, recebeu um telefonema de uma pessoa que se diziam trabalhar no estabelecimento, relatando que o entregador tinha sofrido um acidente. Foi solicitado que o aposentado cancelasse o pedido no aplicativo, pois um funcionário do próprio restaurante levaria seu pedido. Para isso, no entanto, ele precisaria pagar o pedido no ato da entrega.

Após o suposto entregador chegar e solicitar o cartão, a vítima percebeu que o visor da máquina estava quebrado. O comprovante também não foi impresso, já que o homem alegou que o envio seria por e-mail. Apenas alguns dias depois, o aposentado constatou que o golpista tinha passado  R$5 mil em seu cartão.

Leilões forjados

Falsários ‘criam’ eventos de vendas de bens como automóveis, que jamais serão entregues

O golpe do falso leilão de carros Foto: André Mello - Editoria de Arte
O golpe do falso leilão de carros Foto: André Mello – Editoria de Arte

Z. teve um enorme dissabor depois que arrematou uma moto em um leilão realizado pela internet. Após fazer o pagamento de R$ 15,9 mil, valor do lance que havia feito, o comerciante deparou-se com um terreno baldio ao procurar o endereço onde deveria fazer a retirada do veículo. Desesperado, ele começou a indagar a pessoas que passavam pelo local se sabiam onde funcionava a empresa Begônia Leilões, que seria a responsável pela venda. Ficou surpreso ao saber que, assim como ele, várias vítimas apareciam naquele mesmo endereço para buscar carros que supostamente tinham arrematado. Naquele momento, teve certeza de que tinha sido vítima de criminosos.

— Tentei várias vezes fazer contato com a empresa, mas simplesmente ninguém atendia nem respondia minhas mensagens. A sensação é de completa impotência.

Nesse tipo de golpe, os criminosos simulam leilões de veículos para que as vítimas paguem valores acreditando que estão arrematando carros ou motos.

No site Reclame Aqui, que reúne relatos de consumidores a respeito de marcas ou estabelecimentos, usuários fazem alertas sobre a Begônia Leilões. “Golpistas. Tomem cuidado. Site falso, WhatsAp falso”, escreveu um deles. O outro questiona o fato do nome do leiloeiro que constava no site da empresa não aparecer no site da Junta Comercial.

Central do cartão

Bandidos chegam a montar estruturas que dispõem até de motoboys

O golpe da central do cartão Foto: André Mello - Editoria de Arte
O golpe da central do cartão Foto: André Mello – Editoria de Arte

Na Zona Oeste do Rio, a polícia identificou a presença cada vez mais comum das chamadas centrais de telemarketing do crime. Em apartamentos na Barra da Tijuca e no Recreio, estelionatários montam locais de onde fazem chamadas para as vítimas, simulando estar ligando de centrais bancárias. O intuito é fazer com que as pessoas que são alvo do grupo – preferencialmente idosos –  passem seus dados de cartões para as quadrilhas. O investimento nas centrais demonstram a especialização e aperfeiçoamento do golpe.

A aposentada J., de 78 anos, foi vítima de uma das quadrilhas. O prejuízo total com o golpe foi de R$ 12 mil. A idosa estava em sua casa, quando recebeu um telefonema de uma pessoa que se apresentou como funcionária de seu banco, pedindo que ela confirmasse a veracidade de duas compras. Como não tinham sido feitas por ela, a vítima rechaçou ambas. A pessoa que estava do outro lado da linha disse que cancelaria a compra, mas pediu que a idosa ligasse para a central de seu cartão.

A vítima seguiu a orientação e entrou em contato com o número que aparecia no verso do seu cartão. Naquilo que parecia uma nova ligação, ela forneceu seus dados bancários e foi informada de que um funcionário do banco passaria em sua residência para buscar seu cartão de crédito. Logo após o contato, um motoboy passou na casa da idosa. Os golpistas fizeram compras e até saques com o cartão da vítima.

Nesse tipo de golpe, ao pedir que a vítima ligue para a central do cartão, os golpistas conseguem bloquear a linha e têm todo o aparato para simular uma nova ligação. A tática dá mais credeibilidade à fraude, já que a pessoa acredita de fato estar ligando para um número que ela própria discou.

— Ela acabou entregando seu cartão ingenuamente. No mesmo dia, começaram a movimentar a conta dela. O prejuízo foi alto, mas ela acabou conseguindo recuperar o valor — explica o advogado Carlos Eduardo Bispo, que representou a aposentada em uma ação judicial contra o banco.

A vítima conseguiu reaver boa parte da quantia perdida após uma audiência com o banco, intermeadiada pela Comissão de Defesa do Consumidor da Alerj. Mas precisou entrar com uma ação judicial para recuperar R$ 2,2 mil que faltavam.

Quadrilhas que aplicam esse tipo de fraude algumas vezes não chegam a fazer a retirada do cartão com motoboys. Pode acontecer de os estelionatários conseguirem que a vítima forneça seus dados bancários pelo telefone, sendo suficiente para usá-los em compras e outros pagamentos.

A delegada Márcia Beck, da 40ª DP (Honório Gurgel), prendeu no mês passado cinco mulheres acusadas de aplicar esse golpe. A polícia ainda apura quantas vítimas o grupo fez, mas estima que sejam milhares porque atingia até moradores de outros estados, como Santa Catarina. A quadrilha tinha como seus principais alvos pessoas idosas. A polícia também apurava a quantia que o grupo movimentava.

— Nessas informações que encontramos nas anotações, uma das garotas, em 15 dias, teve um lucro de R$ 400 mil, de onde é possível observar que a movimentação de dinheiro é muito grande — afirmou a delegada.

Falso sequestro

Vítimas são convencidas de que parentes são mantidos reféns por bandidos

O golpe do falso sequestro Foto: André Mello - Editoria de Arte
O golpe do falso sequestro Foto: André Mello – Editoria de Arte

Em fevereiro deste ano, a mãe da atriz Cacau Protásio quase foi vítima de bandidos que, pelo telefone, simularam o sequestro da irmã da artista. A idosa chegou a sair de casa e pegou um táxi para levar o dinheiro para o bando, mas foi orientada pelo motorista a procurar a Delegacia Antissequestro, no Leblon, Zona Sul do Rio. Lá, os investigadores descobriram que os criminosos tentavam aplicar o chamado “golpe do falso sequestro”. Nele, os bandidos ligam para a vítima, simulam ter sequestrado um parente dela e exigem dinheiro para liberá-lo. O golpe é famoso, mas continua fazendo vítimas.

A mãe de Cacau, acreditando estar falando com a filha, ficou a noite inteira no telefone com os bandidos.

“Minha mãe recebeu uma ligação, às nove da noite, de um sequestrador, dizendo que estava com a minha irmã. Eles colocam aqueles vozes ‘mãe, socorro, pelo amor de Deus’… E a mãe fica desesperada. Minha mãe ficou a noite inteira com eles no telefone. E, de manhã, disseram para ela levar o dinheiro até a (rodovia) Rio-Petrópolis. Ela iria sair para levar”, relatou a atriz, que usou sua rede social para alertar sobre o que tinha acontecido com a mãe.

As investigações da Polícia Civil do Rio apontam que esse tipo de golpe, em muitos casos, é aplicado por criminosos que estão  presos. Com celulares obtidos atrás das grades, eles fazem as ligações. Os bandidos que cometem esse tipo de crime chegaram a criar, dentro do sistema prisional, uma espécie de facção batizada de Povo de Israel.

Corridas de táxi superfaturadas

Motoristas cobram valores mais altos, com uso de maquininhas com visor quebrado

O golpe da corrida de táxi superfaturada Foto: André Mello - Editoria de Arte
O golpe da corrida de táxi superfaturada Foto: André Mello – Editoria de Arte

Laís, de 64 anos, fez uma curta corrida de táxi entre dois bairros da Zona Sul do Rio que custou R$ 30. Era uma noite chuvosa e a idosa se recorda de ter ouvido diversas vezes, do motorista, que estava sem troco, por isso desejava que o pagamento fosse feito no cartão. Ao chegar em seu destino, a passageira sacou uma nota de R$ 50 e encontrou resistência do taxista.

Ela decidiu passar o cartão na maquininha, mas o motorista afirmava que a transação não completava, pois o sistema estaria fora do ar. Cheia de sacolas e vendo a chuva apertar, Laís decidiu dar os R$ 50 para o taxista e afirmou que não precisava de troco.

Apenas dias depois a idosa se deu conta de que tinha sido vítima de um crime. Na sua conta bancária, havia um débito de R$ 3 mil, valor passado pelo taxista na máquina de cartão.

— Eu já estava com minha conta negativa e ficou ainda mais. Foi um susto. Na delegacia (da Gávea) soube que ele (taxista) já tinha lesado várias pessoas e contava com um comparsa.

Taxistas são investigados pela Polícia Civil do Rio por aplicar esse tipo de golpe. Na hora de cobrar o valor da corrida, os motoristas digitam valor bem acima do que deveria ser pago pelo passageiro. Muitas vezes, as maquininhas de cartão estão com o visor quebrado, impedindo que a vítima veja que está sendo enganada.

No início deste mês, um taxista foi indiciado pela 15ª DP (Gávea) por ter passado no cartão de débito de passageiros R$ 3,5 mil por uma corrida de cerca de quatro quilômetros. Nessa modalidade, os criminosos têm como principais vítimas jovens retornando de festas, turistas e idosos.

Investimentos falsos

Esquemas criminosos lesam milhares de pessoas

O golpe do investimento falso Foto: André Mello - Editoria de Arte
O golpe do investimento falso Foto: André Mello – Editoria de Arte

O pedreiro S., de 56 anos, vai diariamente à porta da empresa Black Warrior (BW), em Cabo Frio, tentar que os R$ 60 mil investidos por ele e sua família sejam devolvidos. O dinheiro foi entregue com a promessa de que seria investido em criptomoedas. O lucro prometido era exorbitante: 30% ao mês. Segundo denúncias de clientes como o pedreiro, recentemente a empresa fechou as portas e deixou de pagar os valores prometidos.

A BW é uma das 10 empresas que estão na mira das polícias Civil e Federal em Cabo Frio, que ficou conhecida como “Novo Egito”, em razão das pirâmides financeiras.

A suspeita da polícia é de que muitas das empresas que recebem quantias para investir em criptomoedas, na realidade, não aplicam os valores recebidos. Os clientes até chegam a ser inicialmente pagos, mas com o dinheiro de outros que estão aderindo ao negócio. Em determinado momento diz-se que a pirâmide ” quebra” e a empresa não consegue mais pagar os supostos investidores.

S., morador do bairro Jardim Esperança, em Cabo Frio, é casado e pai de dois filhos e usou para investir na empresa as economias da vida inteira. Outras pessoas de sua família também são clientes da BW.

— Eu tinha R$ 35 mil na poupança. Com o novo rendimento, eu queria comprar um carro. A empresa já era conhecida aqui no bairro há mais de seis meses. Todo mundo investia lá e recebia normalmente. Inicialmente, coloquei R$ 10 mil. No primeiro e no segundo mês, eu recebi certinho, 30% desse valor. Com isso, peguei mais R$ 25 mil que tinha e apliquei. Depois disso, não recebi mais nada — disse, com os olhos cheios d’água.

Assim como o pedreiro S., dezenas de investidores fazem a mesma peregrinação, indo à sede da empresa com frequência para tentar reaver o dinheiro que aplicaram. O GLOBO não conseguiu contato com representantes da Black Warrior, que não tem site oficial, nem página nas redes sociais e não é habilitada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O jornal também foi ao endereço da firma, mas o local estava fechado.

— Há meses, a gente vai lá (à empresa) para receber. Mas eles dizem que têm muitos clientes para devolver dinheiro. A gente não pensou no risco porque eles estavam pagando certinho. Por isso, não vi tanto problema. Esse dinheiro está me fazendo muita falta agora — disse o pedreiro.

Golpe da cessão do crédito

Estelionatários levam pessoas a fazerem dívidas, que acabam não sendo pagas

Golpe da falsa empresa de quitação de empréstimo Foto: André Mello - Editoria de Arte
Golpe da falsa empresa de quitação de empréstimo Foto: André Mello – Editoria de Arte

O servidor público W., de 59 anos,  lamenta que tenha chegado a desconfiar quando recebeu um telefonema do representante da RCS promotora de Vendas, que apesar do nome atuava como financeira. A oferta era tentadora: ele deveria pegar um empréstimo e entregar o dinheiro à empresa, que se comprometia a investir aquele valor e  dar lucros ao cliente, além de pagar a dívida contraída por ele com o banco.

W. chegou a duvidar, mas como verificou que a empresa possuía CNPJ e funcionava em um endereço no Centro do Rio, acreditou que não se tratava de golpe. O servidor pegou quatro empréstimos e repassou os valores para a empresa. Inicialmente, teve de volta 13% dos valores investidos e algumas parcelas dos empréstimos chegaram a ser pagas pela empresa. Há cerca de quatro meses, a empresa deixou de pagar sua dívida com o banco, alegando passar por dificuldades financeiras.

— Estou com três parcelas atrasadas de cada um dos quatro empréstimos que tenho. Mensalmente, são  R$ 4,6 mil que preciso pagar de parcelas e eu entreguei quase R$ 200 mil à RCS. Todo dinheiro do empréstimo foi para eles.  O prejuízo é imenso — lamenta.

O delegado Bruno Gilaberte, que prendeu nove pessoas da RCS no mês passado, explica que o que a empresa faz nada mais é do que uma pirâmide financeira. Segundo ele, não há um investimento de fato. Os valores das parcelas de empréstimo dos clientes são pagos com a chegada de novos clientes.

— É um tipo de pirâmide. A empresa fecha um contrato já sabendo que está constituindo negócio ruinoso, então há um dolo de lesar essas pessoas desde o início — explica o delegado.

Nesse tipo de golpe, é comum que os estelionatários fechem as empresas depois de um tempo pagando algumas parcelas e angariando novas vítimas. Em seguida, eles abrem outras empresas em nomes de “laranjas” para continuar aplicando golpes.

— Em um primeiro momento, eu não acreditei porque não me considero uma pessoa ingênua. Mas quando vi que eles tinham CNPJ, funcionavam em um endereço no Centro do Rio, acabei caindo. Mas quando a esmola é muita, o santo tem que desconfiar — afirma W.

Como evitar cair

Polícia recomenda cuidado especial com fornecimento de dados pessoais

Como prevenir golpes Foto: André Mello - Editoria de Arte
Como prevenir golpes Foto: André Mello – Editoria de Arte

Uma das dicas é para evitar que a população caia no golpe do WhatsApp. A recomendação é para que nenhum código recebido por SMS seja repassado a terceiros em nenhuma hipótese. É com esse código que os golpistas conseguem clonar o WhatsApp da vítima. Outra dica é ativar a verificação em duas etapas na configuração do aplicativo de mensagens, o que dificulta a fraude.

O manual traz ainda dicas para evitar cair em golpes de uma maneira geral, como desconfiar de ofertas muito vantajosas e produtos milagrosos. O documento ainda recomenda que o consumidor confira sempre se está no site ou perfil em rede social oficial de uma empresa ou estabelecimento.

Para compras em leilões, o manual recomenda que seja feita uma consulta no site www.leilaoseguro.org.br/falsos, especializado em verificar a veracidade das páginas desse tipo de venda.

A delegada Marcia Beck, que prendeu uma quadrilha que aplicava o golpe conhecido como “central do cartão”, alerta que nenhum dado bancário ou pessoal deve ser fornecido pelo telefone, principalmente senhas de contas ou cartões.

O ideal, ao receber qualquer ligação relatando um suposto problema com sua conta corrente ou cartão, é ir até uma agência bancária ou, se não for possível, ligar para a central do banco de um número diferente daquele que a pessoa tenha recebido a ligação. Isso porque as quadrilhas conseguem bloquear o telefone pelo qual fizeram contato e fazem a vítima acreditar que ligou para a central de seu banco, quando na verdade continua na linha com um golpista.

— É preciso muito cuidado, porque tudo é muito bem organizado para conseguir enganar as vítimas — afirma a delegada, alertando que os bancos quando ligam para os clientes não costumam pedir dados pessoais e, muito menos, senhas.

Já o delegado Bruno Gilaberte chama atenção para as promessas de rendimentos irreais.  Ele alerta que as pessoas devem desconfiar de garantias de lucros muito bons com investimentos.

Fonte: O Globo

Rubem Gama

*Servidor público municipal, acadêmico de Direito, jornalista (MTB nº 06480/BA), ativista social, criador da Agência Gama Comunicação e do portal de notícias rubemgama.com. E-mail: contato@rubemgama.com

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