Internacional

Onda de protestos em Cuba reacende debates mundiais; entenda a crise

Cuba tem manifestações por 'liberdade' em diferentes localidades. Foto: Yamil Lage/AFP

Nem todos os que protestam em Cuba são contrarrevolucionários. A maioria é de pessoas insatisfeitas, confusas, talvez mal-informadas, ou, também, querendo manifestar alguma situação particular. Essas palavras foram ditas pelo presidente, Miguel Díaz-Canel, após grandes atos no domingo 11 — os maiores desde 1994, quando o governo virou alvo de revoltas por conta da debacle decorrente da queda da União Soviética.

As marchas populares começaram no município de San Antonio de los Baños e, segundo a BBC, espalharam-se por mais de 20 localidades. Vídeos e fotos sugerem repressão policial, mas não foram divulgados números oficiais de feridos e detidos. Ativistas críticos ao governo cubano reportam pelo menos 100 desaparecidos e presos.

Três grandes problemas

O pano de fundo é um preocupante cenário econômico. Depois de um crescimento de 0,5% em 2019, o PIB caiu em 2020 estimados 8,5%. O déficit fiscal do Estado corresponde a 9% do PIB, segundo informe da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, a Cepal. Num país de 11,3 milhões de habitantes, a taxa de desemprego fechou o ano passado em 3,87% — obviamente, um percentual bem mais baixo do que no Brasil naquele momento (13,9%), mas crescente.

O governo anunciou subsídios de pelo menos 1.528 mil pesos cubanos a trabalhadores sem emprego. Mas o auxílio não é suficiente para o acesso à comida. De acordo com a plataforma Connectas, isso se deve à baixa produtividade agrícola da ilha, que enfrenta condições precárias e um clima adverso que dificulta a obtenção de itens como carne, leite e hortaliças. Cuba importa 70% dos alimentos que consome e paga por eles cerca de 2 bilhões de dólares anuais. A ONU elogia iniciativas estatais, mas descreve um menu pobre em nutrientes e pouco saudável e variado. Segundo um relatório da organização, 70% das crianças cubanas entre seis e 11 anos vive em insegurança alimentar. Entre os idosos, a taxa é de 15%. Há, ainda, prevalência de casos de anemia e obesidade.

A crise também atinge o fornecimento de energia elétrica, com reincidência de apagões. Ministros admitem falta de manutenção nos equipamentos e problemas de abastecimento de combustível, mas apontam dificuldades. Cuba teria consumido cerca de 207 mil toneladas de diesel no 1º semestre deste ano: bem mais que as 70 mil toneladas do combustível que teve disponível nos meses recentes. A solução é importar. Mas, segundo o governo, um barco com apenas 3 mil toneladas de diesel custa cerca de 25 milhões de dólares.

Outro fator de tensão é o agravamento da pandemia. Na segunda feira 12, Cuba atingiu recorde de casos Covid-19, com 6.423 casos e 42 mortes, chegando a quase 245 mil contágios e 1,6 mil falecimentos. O temor de uma nova onda pela variante Delta, já detectada na ilha, aflige o governo. Os gastos com medidas sanitárias têm sido vultuosos e prejudicado as fontes de receita, como o turismo.

MIGUEL DÍAZ-CANEL, PRESIDENTE DE CUBA, EM PRONUNCIAMENTO APÓS PROTESTOS. FOTO: REPRODUÇÃO

Rubem Gama

*Servidor público municipal, acadêmico de Direito, jornalista (MTB nº 06480/BA), ativista social, criador da Agência Gama Comunicação e do portal de notícias rubemgama.com. E-mail: contato@rubemgama.com

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