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Com 3 evangélicos em ministério, governo Lula frustra lideranças religiosas

Aliados do presidente eleito temem que a falta de diálogo com segmento religioso dificulte a aprovação de medidas prioritárias para o governo no Congresso

A deputada eleita Marina Silva (Rede-SP), o ex-presidente Lula (PT) e a senadora Simone Tebet (MDB-MS) em ato em Teófilo Otoni (MG)
A deputada eleita Marina Silva (Rede-SP), o ex-presidente Lula (PT) e a senadora Simone Tebet (MDB-MS) em ato em Teófilo Otoni (MG) Ricardo Stuckert/Divulgação

Com apenas três ministros evangélicos – Marina Silva (Meio Ambiente), Daniela do Waguinho (Turismo) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União) –, o ministério do presidente Luiz Inácio Lula da Silva frustrou algumas lideranças religiosas de quem pode precisar ao longo do mandato.

A principal queixa, ouvida pela equipe da coluna entre parlamentares e representantes desse segmento do eleitorado, é a de que Lula não ouviu a influente Frente Parlamentar Evangélica na composição do primeiro escalão do governo, nem escolheu nomes que tenham representatividade nacional entre esses religiosos.

“Política é feita de gestos e simbolismos. Não tem ninguém no governo Lula que tenha a cara nacional do movimento evangélico”, critica um congressista lulista que costuma fazer a ponte com esse público. Esse aliado de Lula teme que a falta de diálogo com evangélicos, que têm uma bancada de mais de 100 deputados, dificulte a aprovação de medidas prioritárias para o novo governo no Congresso.

Marina Silva, por exemplo, é uma política de projeção até internacional, mas é muito mais reconhecida como liderança ambiental do que evangélica por seus pares. “Sou cristã e nunca instrumentalizei a fé nem as igrejas”, disse ela durante a campanha eleitoral. Marina é da Assembleia de Deus.

Daniela do Waguinho, que também é evangélica e frequenta a Casa da Benção, na Ilha do Governador, costuma frequentar os cultos comandados pela missionária Lucy Porto, mas é vista por parlamentares mais como uma liderança regional.

Já o futuro chefe da Advocacia-Geral da União, Messias é da Igreja Batista, mas não costuma falar sobre sua religião – alguns integrantes da equipe de transição que são evangélicos nem sabiam da crença pessoal do novo ministro, até serem informados pela reportagem.

“Não nos representam essas escolhas do Lula, e olha que a nossa bancada representa mais de 100 votos”, critica o deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP), que está cotado para assumir em fevereiro o comando da Frente Parlamentar Evangélica.

“O presidente Lula não nos consultou sobre a composição da equipe e está deixando os evangélicos de fora. Isso é uma avaliação dele, que não acha importante o nosso apoio. Mas quem precisa de voto é o Lula, não sou eu”, acrescenta.

Em quatro anos, o governo Bolsonaro contou com nove ministros evangélicos.

Uma das principais queixas de parlamentares evangélicos em relação ao novo governo Lula é com a ausência da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) do primeiro escalão do governo, mesmo ela tendo sido uma das principais interlocutoras de Lula com o segmento durante a campanha eleitoral.

“A composição de um governo democrático é conformada pelas forças sociais e políticas que o sustentam. Parece que, no caso do governo Lula 3, vendo a formação ministerial, os evangélicos não são considerados como força social ou política”, critica o diretor de assuntos internacionais da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), Uziel Santana.

Durante o governo Bolsonaro, a Anajure endossou algumas das principais escolhas feitas pelo presidente da República, como a indicação de André Mendonça – “terrivelmente evangélico” — para o Supremo Tribunal Federal (STF) e da advogada Maria Claudia Bucchianeri para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele é evangélico; ela, não.

Em 2022, a entidade ficou neutra e não declarou apoio oficialmente a nenhum presidenciável.

A resistência dos evangélicos a Lula foi um dos principais desafios na difícil campanha para impedir a reeleição de Bolsonaro. O presidente da República teve apoio maciço dessa fatia do eleitorado, atraído pelo discurso conservador, em defesa da “família” e radicalmente contrário à descriminalização do aborto e das drogas.

Do lado lulista, o próprio Jorge Messias ajudou na formulação das estratégias para tentar atrair esse segmento do eleitorado. Na véspera do segundo turno, a campanha do PT divulgou uma carta voltada para esse público.

No documento, Lula garantia que não fecharia igrejas ou alteraria a legislação sobre aborto, mas antes mesmo do resultado das urnas os próprios petistas admitiam que a luta pelo voto evangélico era uma batalha perdida.

“O governo eleito ainda não tem o apoio massivo dos evangélicos, e precisará ter para garantir a sustentabilidade da base popular. Esse apoio deve ser conquistado através de ferramentas que permitam às pessoas desenvolverem pensamentos, decisões e posições autônomas”, alertou a Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, em relatório obtido pela coluna que foi enviado à equipe de transição no mês passado.

Em meio às críticas, a futura ministra Daniela do Waguinho afirmou à equipe da coluna que Lula “sempre dialogou com os evangélicos e desta vez não será diferente”. Ela lembrou que, nos seus dois governos, Lula sancionou o projeto que garante liberdade às igrejas e entidades religiosas e criou o Dia Nacional da Marcha Para Jesus.

Por Rafael Moraes Moura

Rubem Gama

*Servidor público municipal, acadêmico de Direito, jornalista (MTB nº 06480/BA), ativista social, criador da Agência Gama Comunicação e do portal de notícias rubemgama.com. E-mail: contato@rubemgama.com

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