Talibã nomeia enviado afegão à ONU e pede para se pronunciar na Assembleia Geral
Ação configura confronto com Ghulam Isaczai, embaixador que representa, nas Nações Unidas, o governo do Afeganistão deposto no mês passado pela milícia fundamentalista
NAÇÕES UNIDAS — O Talibã pediu para se dirigir aos líderes mundiais nas Nações Unidas em Nova York nesta semana e nomeou um de seus porta-vozes, Suhail Shaheen, baseado em Doha, como embaixador do Afeganistão nas Nações Unidas, de acordo com uma carta vista pela Reuters nesta terça-feira.
O ministro das Relações Exteriores do governo do Talibã, Amir Khan Muttaqi, fez o pedido em uma carta ao secretário-geral da ONU, António Guterres, na segunda-feira. Muttaqi pediu para falar durante a reunião anual da Assembleia Geral, que termina na próxima segunda-feira.
O porta-voz de Guterres, Farhan Haq, confirmou a carta de Muttaqi. A ação configura um confronto com Ghulam Isaczai, o embaixador que representa, nas Nações Unidas o governo do Afeganistão deposto no mês passado pelo Talibã. Embora o presidente anterior, Ashraf Ghani, tenha fugido do Afeganistão, o governo do Talibã ainda não recebeu o reconhecimento formal de nenhum país.
Haq disse que os pedidos concorrentes do Afeganistão pelo assento na ONU foram enviados a um comitê de credenciais formado por nove membros, incluindo Estados Unidos, China e Rússia. É improvável que o comitê se reúna para deliberar sobre o assunto antes do fim da 76ª Assembleia Geral, então é duvidoso que o ministro das Relações Exteriores do Talibã fale ao órgão mundial nesta sessão.
A eventual aceitação do embaixador do Talibã pela ONU seria um passo importante na tentativa do grupo fundamentalista de obter reconhecimento internacional, o que poderia ajudar a liberar fundos extremamente necessários para a economia afegã, que enfrenta a suspensão do financiamento internacional.
Guterres disse que o desejo do Talibã de reconhecimento internacional é a única alavanca que outros países têm para pressionar por um governo inclusivo e que respeite os direitos humanos, especialmente das mulheres, no Afeganistão.
A carta do Talibã disse que a missão de Isaczai “é considerada encerrada e que ele não representa mais o Afeganistão”.
Até que uma decisão seja tomada pelo comitê, Isaczai permanecerá na cadeira, de acordo com as regras da Assembleia Geral. Ele deverá discursar no último dia da reunião, em 27 de setembro, mas não ficou claro se algum país poderia objetar após a carta do Talibã.
O comitê tradicionalmente se reúne em outubro ou novembro para avaliar as credenciais de todos os membros da ONU antes de enviar um relatório para aprovação da Assembleia Geral antes do final do ano. O comitê e a Assembleia Geral geralmente operam por consenso em relação às credenciais, disseram diplomatas.
Outros membros do comitê são Bahamas, Butão, Chile, Namíbia, Serra Leoa e Suécia.
Quando o Talibã governou pela última vez, entre 1996 e 2001, seu governo foi reconhecido apenas por Paquistão, Emirados Árabes e Arábia Saudita, O embaixador do governo afegão que eles derrubaram continuou sendo o representante na ONU, depois que o comitê de credenciais adiou sua decisão sobre reivindicações adversárias ao assento.
A situação hoje é diferente, e países como China e Rússia já indicaram que poderão reconhecer o novo governo, se obterem garantias de estabilidade e combate a grupos terroristas no Afeganistão. Pequim também pediu um “governo inclusivo” de diferentes grupos e etnias, que até agora não aconteceu, apesar das promessas de moderação do Talibã.
Via O Globo/Reuters